sexta-feira, 25 de novembro de 2011

ARTE TUPINAMBÁ DE LITHOSILVA




Ao adotar a arte como estiIo de vida, o meu primeiro desafio foi o de encontrar um conceito para arte. Como desenvolver uma atividade sem ter o conhecimento da sua natureza? Depois de coIher várias informações, adotei, por achar mais confortável, o conceito da estética como fora cunhada peIo filósofo alemão Alexander Baugarten (1714-1762): ”Uma ciência do conhecimento sensorial que contrapõe a razão em busca de uma verdade". O segundo desafio foi vivenciar este saber, a arte como uma ciência de conhecimento sensorial e como usar os sentidos para captar as informações e processar conhecimentos. Desde Os meus 30 anos de existência tive a oportunidade de conhecer e praticar a nobre filosofia do Yôga, e a meditação sempre foi a prática da minha preferência. Busquei colher os frutos desta prática para aplicar na atividade escolhida como um estilo de vida: o de ser artista.

Restou então a escolha das perguntas para buscar as respostas. Duas questões incomodavam, há muito, minha alma de artista. A primeira, de natureza cultural e social: Quais são os signos e símbolos matrizes que estruturam a identidade cultural da minha comunidade, Alagoinhas? A segunda é a natureza do conceito do homem livre. A resposta para ambas eu encontrei na organização da civilização Tupinambá, uma sociedade sem Senhor e sem obediência, cujos fazeres e objetos ainda são adotados pela nossa gente. Dediquei então o meu tempo na busca do saber dessas unidades resistentes. As informações colhidas revelam os objetos criativos: as pinturas e as esculturas - a minha arte. No prazer de pintar, adotei os princípios da arte Kusiwa que quer dizer em Tupi, ”o caminho dos riscos". Construo, então, com os riscos, um texto iconográfico, a alma da mensagem, que ora pode estar em forma de figura de uma unidade resistente, ora é a própria alma. Pelos valores interpretativos, utilizo os pigmentos naturais: a argila, o carvão e o urucum. Elaboro, com o pincel e com os dedos, campos de uma paisagem monocromática afinada com a elegância, convidando assim, o observador a uma meditação. Na escultura utilizo os elementos que expressam a resistência do ser que busca a consciência do homem livre: o barro, o ferro e a pedra. Para realizar a missão da arte, como meio de obter e de passar conhecimento, tenho me dedicado, com muita paciência, a observação, para criar uma Iinguagem própria que preencha o olhar conquistado, estabelecendo, assim, uma conexão inteligente entre criador e observador.

A minha caminhada teve início há 44 anos como desenhista, depois Pintor de Sentimentos, técnico em arquitetura, designer e, finalmente, escultor. Três anos como artista residente no Centro de Cultura de Alagoinhas e pesquisador da nossa cultura matriz. Com obras espalhadas pelo planeta, tenho amadurecido, realizando exposições na capital e no interior da Bahia. Em 2006, conquistei  o prêmio "Destaque no Salão de Artes Visuais da Bahia" realizado em Alagoinhas. Em 2008, participei da Bienal do Recôncavo em S. Félix e dos Salões Regionais de Artes Visuais da Bahia, como homenageado, na edição de Alagoinhas, pelas pesquisas realizadas e pelo conjunto da obra, sendo que uma delas foi escolhida para a identidade visual dos Salões Regionais de 2009, promovidos pela Fundação Cultural do Estado da Bahia. Hoje tenho o sonho de conquistar a consciência indígena através da arte, e de entender três dos seus mitos; o do não hum, o dos abandonados e o de que o sofrimento constrói sonhos e poder.

Numa sociedade onde a leitura é paixão de poucos e onde não se conhece a sua própria identidade cultural, falta a capacidade de descobrir os elementos matrizes dos seus costumes de viver - ainda encantada com os valores do branco europeu e do negro africano. Desenvolver uma atividade estética focando a cultura indígena torna—se uma missão de visionários, isto porque, existem na comunidade as unidades resistentes, como a mandioca e seus derivados, assim como os artefatos de fibra vegetal participando ativamente do dia a dia dessa gente. E ai onde o artista tem de cumprir o seu papel como cidadão: dar visibilidade aos valores cognitivos desta gente simples que vive na zona rural, para construir a sua inclusão ultural e social. Uma missão realizada a duras penas, como sobrevivência para o artista, numa cidade em que a cultura não é protagonista nas organizações institucionais e onde falta espaço cultural e comercial para que suas obras possam ser contempladas e comercializadas. Neste contexto, a arte e o artista passam a ser códigos a desvendar.

Fonte: ACIA Divulga, Setembro de 2010  Redação: Midian Bispo

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